Blog Acesso - Luiza Costa
“Pois a arte é infância. Arte significa não saber que o mundo já é, e fazer um. Não destruir nada que se encontra, mas simplesmente não achar nada pronto. Nada mais que possibilidades. Nada mais que desejos. E, de repente, ser realização, ser verão, ter sol”. Tantas outras definições de o que é a arte quiseram ser um dia como essa, escrita por Rainer Maria Rilke, em Cartas do poeta sobre a vida. Porém, foi o poeta austro-húngaro do início do século passado que conseguiu transformar tantas inspirações em palavras. Rilke mesmo, que escrevera certa vez que “mais inexprimíveis do que qualquer outra coisa são as obras de arte”; e que ao desconsiderar a importância do valor crítico em relação às percepções e sensações íntimas disse: “as obras de arte são de uma solidão infinita: nada pior do que a crítica para as abordar. Apenas o amor pode captá-las, conservá-las, ser justo em relação a elas”.
Advindo desse e de outros assertivos pensamentos, de que a beleza e o conhecimento de obras de arte devem ser sentidos e vividos mais do que analisados simplesmente por seu rigoroso valor estético, que foram concebidas novas idéias para o aprendizado da arte em escolas e instituições culturais. Assim, para abordar o assunto que permeia a relação educacional entre escolas e museus e mostrar sua importância para o desenvolvimento formativo e social, foi realizado, no último sábado, dia 22 de maio, no Paço das Artes, centro cultural ligado à Universidade de São Paulo-USP, o debate Arte e Ensino – uma relação entre a escola e o museu, como parte da 8ª Semana Nacional de Museus.
Para trazer insumos ao debate, foram convidadas as responsáveis pela coordenação de educação da 29ª Bienal de São Paulo, Stela Barbieri, que também é diretora da Ação Educativa do Instituto Tomie Ohtake, e Mariza Szpingel, também coordenadora de arte da Escola da Vila.
Ao longo dos anos, muito se tem falado e escrito sobre a necessidade da inclusão da arte na escola de forma efetiva. Mas foi em 1971, quando a Lei 5692 tornou oficial a necessidade da disciplina de Educação Artística nos currículos escolares, que esse assunto ganhou maior atenção dos estudiosos. Porém, se a teoria trazia perspectivas positivas para os educadores da área, que ampliavam seu conhecimento, era no confronto com a prática pedagógica que se via a grande distância entre concepções e aplicações. Segundo Stela Barbieri, a educação na arte – para alguns, arte na educação – “vem ganhando muito espaço. Porém, durante muito tempo, foi completamente deixada de lado”. Ela explica que a educação está conectada à infância e o envolvimento da arte nessa união é enriquecedor.
Mesmo hoje, com tantos avanços, ainda não se consegue contemplar totalmente a diversidade de pensamento na arte-educação. Se a aceitação de que o fazer artístico e a fruição estética contribuem para o desenvolvimento de crianças e de jovens é ampla, sua aplicação deve ser modificada. “Não basta o conhecimento, é preciso encontrar meios e recursos para conseguir esse resultado”, ressalta Barbieri. E o conhecimento pode se dar de várias maneiras. “A criança tem uma enorme potência de inventar. Então, não é satisfatória a criação de inúmeros sistemas para que elas aprendam. O artista tem essa percepção da criança, que consegue deslocar espaços e funções, que cria inúmeras possibilidades mentais, tornando a troca ainda mais densa”, elocubra. E vai além: “é preciso buscar o olhar da criança e não o do educador. É preciso escutá-la para saber o que quer, o que a inquieta”.
Esta maneira de propor o ensino da arte rompe barreiras de exclusão, visto que a prática educativa está embasada não no talento ou no dom, mas na capacidade de experienciar de cada um. Dessa forma, estimulam-se os educandos a se arriscarem e é por isso, entre outros motivos, que as instituições culturais, por meio de seu ambiente educativo não formal, têm ganho tanto espaço. “Experimentar é uma forma diferente de conhecer”, ainda afirma a diretora da Ação Educativa do Instituto Tomie Ohtake, Stela Barbieri.
Mariza Szpingel enxerga esse impasse por outro ângulo, o de uma instituição de ensino que busca uma prática pedagógica coerente, uma educação que integre aprendizado e arte. Possibilitando o conhecer de um repertório cultural tanto pelo contato quanto por outras referências, sem que haja a imposição de uma forma de conhecimento sobre outra, sem a dicotomia entre ideia e prática. Segundo afirma, “quando uma criança tem sua criatividade e reflexão estimulada, os trabalhos de colégio que pareciam ser chatos se transformam em algo divertido”.
A exemplo, as crianças da escola em que Mariza atua têm seu primeiro contato com um museu no 1º ano do ensino fundamental. “Antes da visita, introduzimos conteúdos específicos em sala de aula. É importante que eles entendam a diferença do espaço da sala de aula e do museológico. Além disso, ao visitarem o museu, podem experimentar o que só viram em aula”, enfatiza Szpingel.
Outro ponto importante desse contato é o trabalho de registro que as crianças realizam. “Peço que desenhem os objetos encontrados no museu que, previamente, haviam sido mostrados em aula. Não há especificações de como deve ser feito esse registro, cabe a cada um sua própria experiência”, relata a professora. Após o retorno em aula, são os registros que possibilitam o resgate do que foi experimentado e aprendido no museu.
Para esse processo de aprendizado da arte, todos os recursos são fundamentais. Mariza Szpingel acredita que é necessário envolver os pais nessa experiência. Uma vez que, após a visita, as crianças manifestam o desejo de apresentar aos pais esse mundo de descobrimentos, é preciso que também eles compreendam e se envolvam com os projetos culturais.
Aristóteles disse uma vez: “a imaginação nasce da mesma região da alma onde nasce a memória”. Assim, estimular a imaginação por meio da arte é fazer com que as primeiras lembranças de futuros jovens e adultos sejam fundamentais para uma vida mais bela e prazerosa.
via: Juliana Leite
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